sábado, 5 de dezembro de 2009

Back to black

Sequei como um riacho num Verão quente e deixei de saciar os pássaros que me beijavam gentilmente.
É Dezembro e chove a potes. O riacho encheu e quem é vivo sempre aparece.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Momento #12


Perdi-me hoje para amanhã me encontrar. Negligenciei o facto de o amanhã nunca chegar e enfrentar todos os dias um novo "hoje", em que me volto a perder. Nunca me encontro, não existo.

quarta-feira, 22 de julho de 2009

Quem é quem?

Natureza morta, cenário podre. É tudo o que os meus olhos conseguem captar e esta é a melhor forma de o descrever: cenário podre.
Por momentos, julgo que conheço o que vejo, penso que outrora fomos amigos íntimos ou mais que isso, penso que fomos o que já não somos.
Tudo o que o meu campo de visão abrange parece-me negro e morto, como flora queimada. E o intenso cheiro desagradável que o sentido da visão alastra para o olfacto e o silêncio cortante como uma lâmina e desafinado como uma guitarra empoeirada, que o odor transporta para a audição. Sabor? Esse não sinto, que há já muito que tenho na boca a sensação encortiçada do amargo da tua.
Que cena perturbadora. À medida que o tempo passa e que vou reconhecendo cada vez mais os traços da vista, desejo ter a capacidade de nunca mais voltar a ter esta percepção do horrível, da ausência de alma, do mal, do negro, de tudo aquilo que nunca quis ser.
Cenário podre, repito o pensamento. E tem mesmo que o ser, ao ponto de me fazer ansiar por uma vida rendida às cordilheiras do Braille.
Pestanejo, mexo um braço, apercebo-me do que vejo e quebro, choro, clamo e tudo o que vejo altera-se ao sabor das minhas atitudes, como se dançasse ao som da música da tal guitarra, de forma pouco coordenada e convidativa.
Espelho. Vejo-me a mim e já lá vai algum tempo desde a última vez. Que cenário podre este.

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Momento #11

Olho atenta e fixamente. Guardo os momentos, como se tirasse fotografias instantâneas deles e as trancasse.
Faço-o com o que não quero perder, mesmo tendo consciência que a despedida pode ser inevitável.
Demoro-me... Na verdade, nunca gostei de me apressar, nem de que me apressassem. Queres saber? Estava a despedir-me com tempo e sem pressas e contei-te 20 sinais na face.

domingo, 31 de maio de 2009

Oh like you were sixteen

A noite avançava com o tempo, lado a lado, e o manto azul tornava-se cada vez mais escuro. A Lua iluminava a beira-mar e as ondas vinham ao meu encontro - o som da sua aproximação não me deixava ser apanhada de surpresa. As estrelas brilhavam, sob a forma de pontos brancos, e notei que se agrupavam, dando origem a formas caricatas.
Deitei-me na areia e nelas distingui imediatamente um triângulo perfeito (que mundo tão geométrico o nosso!). E o som da rebentação das ondas, e o cheiro a maresia e os pés enterrados na areia húmida, parecendo esconderem-se de uma qualquer vergonha.
Aproximaste-te de mim, lentamente, e sentaste-te ao meu lado, com os joelhos ao peito. "Não sentes como o Mundo é perfeito?", disseste como que a deixar escapar as palavras entre os dentes; "Não é perfeito...é redondo. Se andarmos demais na mesma direcção, cairemos". Olhaste-me pensativo e voltaste a fixar-te no oceano. "Já imaginaste onde acaba o oceano?", voltaste a perguntar, assemelhando-te a uma criança na idade dos porquês. Não te respondi, simplesmente por não ter resposta alguma para te dar e sentir-me-ia estúpida por admiti-lo.
Levantaste-te de repente e inspiraste. "Sabes, o som do mar faz-me querer dançar" e esticaste-me a mão, a convidar-me para me juntar a ti na dança. Entreguei-te a minha e puxaste-me para junto do teu corpo. Encostaste o teu queixo à minha cabeça, apertaste-me a cintura e agarraste-me a mão, em forma de pega. "Fecha os olhos", disseste, "Dancemos..."; "Eu não sei dançar. Nunca o soube, tal como não sei onde acaba o oceano...". Desencostaste-te e olhaste-me nos olhos, sem medo. Riste-te simpaticamente. "O Oceano não acaba, expande-se cada vez mais. Daí que haja sempre música junto a ele. E a vantagem de o Mundo ser redondo é que tem uma rotação mais perfeita. Não precisas de saber dançar, agarra-me apenas... A Terra faz o resto e dançaremos até ao raiar do Sol."
E dançámos uma valsa, aos olhos da Lua. E dançámos até a Terra parar. E ainda dançamos.

sábado, 23 de maio de 2009

Momento #10

O golpe que desferiste violentamente sobre o meu corpo fez com que os doces rubis o abandonassem. Argumentas que o fazem lentamente e em pequenas porções e não deixas de ter razão. Porém, há algo pior do que morrer com uma palavra entalada entre os lábios como uma beata?
As pedras, assemelhando-se a um lençol acetinado, deslizam suavemente, em espiral, pelo copo de cristal que inclinas sobre mim.
Aproveita o teu vinho.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Lei do Desábito


A sua pele renegava o calor que sobre ela se abatia, tal como um anticorpo rejeita uma bactéria. Vinda de onde tudo era gélido e mórbido - o seu refúgio, a que chamava usualmente de casa -, o quente não era a sua sensação favorita. Sentia-se como que a derreter, a pele ardia e só lhe faltava crepitar para se achar a ferver no Inferno.
Os olhos fixavam-se nas ondas verticais que pareciam nascer do solo, como flores infinitas e curvilíneas, mas caducas como a sua própria vida.
Dentro do peito, onde já não batia nada senão um martelo de calçada (há muito que o órgão musculado tinha sido substituído por algo mais pesado, seco, crespo e que no interior não tinha nada, a não ser mais do mesmo), a um ritmo cada vez mais acelerado, apoderado por um mal-estar que se devia à exposição a um elemento desconhecido.
À sua volta, pelo que lhe parecia ver, o Mundo girava a uma velocidade vertiginosa, dando a sensação que estava preso à ponta da fisga de uma criança que, a qualquer momento, podia atirá-lo ao amigo de brincadeiras de rua. As imagens, em aparente contradição, eram desfocadas e lentas, como se se arrastassem pela linha do tempo, os sons eram distorcidos e fugiam da boca como saltimbancos da vida sedentária.
Os pingos de suor começavam a percorrer a sua face, ao mesmo tempo que a boca lhe parecia um deserto sem Oásis ao alcance. Pensou que estaria a perder, ao longo da face, todos os líquidos que neste momento escasseavam na sua boca. Um problema de equilíbrio que, no entanto, apenas lhe afectava a nível mental.
As pupílas contraíam-se e as lágrimas, por sua vez, abundavam nos seus olhos. Chegou então à conclusão que Oásis tinha dois, apenas deslocados do seu local normal (não que devesse ter os olhos na boca, ou tal significaria gula, o que Fátima não tolerava. Nenhum entre os sete, aliás).
Devido ao seu carácter ríspido e exigente, o verbo desistir nunca se tinha encontrado na decacentésima vigésima quinta página, na segunda coluna, na quadragésima segunda linha de um qualquer dicionário de bolso, mas agora que o seu corpo parecia estar desprovido de qualquer existência, aparentando ter sido abandonado por si própria, o verbo lutar é que afogou entre o suor. Deixou-se então cair no chão, tal qual uma árvore que cai na floresta, quando ninguém se encontra por perto.
A luz nunca lhe tinha criado tanta aversão. A luz nunca lhe tinha parecido tão forte e natural.
Insensível e aparentemente impenetrável, Fátima, que sempre vivera nas sombras, onde o Inverno durava, normalmente, 365 dias por ano, tinha enfrentado pela primeira vez o Sol. Presenciava, pela primeira vez na sua existência, a alteração da cor, do florido, da luz. Era então Verão, algo como nunca tinha visto. Mas tal demorou ela a perceber, assim como demorou a voltar a si. E ainda mais tempo do seu Verão demorou a ser encontrada, como uma carcaça deixada para trás por um predador - não sendo, porém, carcaça alguma. A cidade estava deserta e afinal, será que se ouve a queda de uma árvore, quando ninguém está por perto?

domingo, 5 de abril de 2009

Momento #9


O corpo é um artefacto ridículo, como as cartas de amor. E ambos nos aprisionam a alma, quando ela é como as cantigas.

domingo, 29 de março de 2009

Ver passar a vida faz-me tédio


O ambiente pesado na pequena vila fazia com que qualquer um se sentisse incomodado. Os sucessivos ataques à integridade e vida humanas tinham abalado a pacata sociedade de Izeda, como se a primeira letra do seu nome fosse vencida numa batalha e substituída pela primeira vogal. Sim, azeda. Era este o adjectivo que, neste momento, melhor caracterizava aquele lugar.
Naquela noite tinha havido um assassinato e o grupo de homens engravatados e fardados de azul continuava numa inquietação quase doentia.

Do outro lado da vila, Ester inseria, lentamente, a chave na fechadura da porta de sua casa. Um movimento cansado e que a fartava de tão repetitivo que se tinha vindo a tornar. Pisou o soalho de madeira cuidadosamente, em bicos de pés, com uma delicadeza tal que parecia caminhar sobre nuvens de Verão. Os seus cabelos ondulados e estonteantemente loiros caíam-lhe pelos ombros e iam de encontro às alças de um vestido vermelho, que acentuava as curvas do seu corpo de uma forma perigosa. Os carnudos lábios pintados de vermelho, complementados pelos olhos devidamente realçados, davam-lhe um ar irresistível. Na mão esquerda carregava um sobretudo preto e uns sapatos de salto da mesma cor, que havia descalçado com medo de fazer barulho. Na outra mão caíam-lhe, de forma desleixada, as chaves com que tinha aberto a porta. Toda aquela indumentária era propícia à provocação do sexo oposto, vertiginosamente sensual, tal como a personalidade associada ao seu nome faria prever.
Resvalou sobre uma cadeira, entregou o seu corpo a todo aquele sentimento de cansaço. Sentiu-se a adormecer e dirigiu-se à cama. Dormiu até ao nascer da maior estrela.

Analisaram a cena do crime. Para além de um cheiro a perda e a pútrido, do espaço ao mesmo tempo tão vazio de tudo e cheio de recordações e da própria vítima, não parecia haver nada de relevante ali. Por momentos, os investigadores desejaram que as paredes pudessem falar e acusar o responsável por tal desgraça.
Após várias horas de investigações inúteis do local, Edgar, um dos inspectores responsáveis pelo caso, reparou numa marca de saltos nas costas da vítima. Irrelevante. Seriam centenas as mulheres da vila e mais ainda os sapatos que teriam um salto do género. Desistiu. Recolheu todas as suas ambições e estreitou os seus horizontes, contrariando a sua própria origem etimológica. Selaram o local e desistiram, pois nunca teriam como encontrar culpados.

Ester levantou-se e olhou-se seriamente ao espelho, sem desviar o olhar e quase sem pestanejar. Os olhos encheram-se-lhe se lágrimas e o queixo tremeu repetidamente. Levou as mãos à testa e quebrou, deixou-se cair e soluçou de dor durante minutos a fio. Quando a fonte secou, ergueu-se e vestiu-se de luto. Sobre os cabelos colocou um lenço espesso, preto e colocou óculos pretos, como os que eram vistos a adornar a face dos que choravam a perda de alguém num velório. Não era possível reconhecer-lhe a cara.

Nas instalações das autoridades, sentiu-se, repentinamente, um odor feminino e sensual. Todos os homens se sentiram claramente atraídos e rendidos a tais encantos. Parecendo deslizar pela sala, entrou Ester, com a cabeça baixa e com uma mão a segurar o lenço junto ao pescoço.
Sentou-se e mandou chamar o inspector responsável pela tragédia que tinha ocorrido a noite anterior.
Edgar sentou-se diante dela. Sem lhe dar tempo para cortesias, Ester rematou "Fui eu, inspector. Fui eu...", "Foi você o quê?", "Fui eu a responsável pela tragédia de ontem", Quer que acredite que foi você quem cometeu uma barbaridades daquelas?", disse Edgar rindo, considerando a afirmação de Ester uma piada de má natureza. "Quero. Se não tivesse sido eu, como saberia então que ele tinha uma marca de salto nas costas? Deste salto", Ester colocou sobre a mesa os sapatos que tinha calçado no dia anterior. O inspector olhou-a incrédulo e, de forma a tentar tirar as dúvidas, disse "Foi você que matou o...?", ao que Ester, sem hesitar, respondeu "Sim, fui eu quem matou aquele cabrão. Nunca gostei dele e ele sempre me atormentou. Filho da puta do Tédio!"

quarta-feira, 25 de março de 2009

O passado é a chave do presente.

Irónico como a manipulação chove como água em pleno Inverno. Somos constantemente atacados por cartazes, notícias que invadem a nossa casa, sem utilizarem para tal uma porta ou janela, deduções ou acusações políticas, medidas que, quando são anunciadas, estão geralmente temperadas com hipérboles. Tentam subornar o nosso pensamento. Sim, tentam formatá-lo das nossas ideias e inserir aquelas que querem que sigamos.
Tantos são aqueles que já estão cegos e não vêm que as amarras já nos voltam a prender as pernas, como há 40 anos atrás. Não se trata só de apertar o cinto, trata-se de apertar isso que nos prende, até nos desmembrarem, até que não tenhamos mais força para nos erguermos.
E acreditamos, na generalidade, que estamos no bom caminho, que melhores dias chegarão, enquanto não nos apercebemos que a porta se fecha lentamente e deixa o último raio de luz do lado de fora. E ficamos impávidos, sem reacção. E deixamos que nos controlem. E deixamos que nos levem tudo o que temos. E deixamos que nos levem as palavras. E caímos na mesma esparrela dos nossos antepassados. E rezamos por uma chuva de cravos. E comemoramos no final. E tentamos construir um melhor sistema, mas a verdade é que colocamos sempre no lugar mais alto aqueles que depois nos espezinham e que nos inserem neste ciclo vicioso. A culpa é do actualismo geológico, é dos ciclos que enfrentamos a toda a hora, da cobardia que nos impede de lutar contra o que achamos estar incorrecto.
Porém, já dizia Andriano Correia de Oliveira, "O trevo tem quatro folhas, quatro sílabas liberdade" e a união...essa faz a força.

segunda-feira, 16 de março de 2009

And after all...






Nunca ninguém teve um sorriso mais puro

Momento #8

Diz a sabedoria popular que, quando se fecha uma porta, abre-se uma janela.
A corrente de ar fechou-me a porta, logo agora que mandei soldar todas as janelas.

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

You have only been gone 10 days (...)

Fecho lentamente os olhos e sorrio. Volto a abri-los. Olho agora para as folhas de uma amoreira que se agitam ao sabor do vento, como que coreografadas durante anos a fio. Absorvo aquele momento (que aprecio da janela de uma camioneta pública), as caras dos que por mim passam e os cheiros que carregam consigo: o cheiro a novo, a perfume, o cheiro pútrido de uma vida menos abençoada, o cheiro a liberdade, a dor, a velhice, a experiência.
Lembro-me que tenho que te contar que hoje vi um estranho peixe...metamorfizou-se nas águas. Mudou de cor à medida que eu o imaginava com cores diferentes, até que desapareceu quando me faltaram hipóteses e, não querendo repetir, não o voltei a imaginar com as suas características iniciais... Jogo então a mão ao bolso para te procurar e o terror espelha-se na minha face. Onde estás tu? Alterno as mãos, de forma cruzada com os bolsos, impacientemente, à tua procura. "Terei eu as calças rotas?", pergunto a mim mesmo. Mas não, rotas é coisa que não estão.
O meu coração bate aceleradamente, até que uma mão pousa no meu ombro. "De que estás tu à procura, Gonçalo?", "Da Lúcia. Ela estava no meu bolso das calças, tenho a certeza que estava... e agora não a encontro lá. Achas que fugiu de mim?", "Não tens as mesmas calças que tinhas ontem, j..." Interrompo-a antes que acabe a sua frase. Claro, as calças não são as mesmas, é natural que aqui não estejas. Que cabeça a minha! Relaxo então, pois sei que estás a salvo onde te deixei.
Desço na minha paragem e apresso o passo até casa. Não me quero esquecer do que tenho para te dizer. Abro a porta de casa e, sem antes me certificar de que esta ficou devidamente fechada, dirijo-me para o meu quarto, fazendo gestos repetitivos e viciantes com os dedos contra as coxas. Agarro numa tesoura, guardada do porta-lápis que me foi dado quando andava na primária (lembras-te?) e sento-me no chão, junto das calças que tinha vestido ontem e que tinha mandado negligentemente para o soalho frio. Rompo os pontos que tinha cosido à boca do bolso para não te deixar fugir e então conto-te tudo sobre o peixe e a dita mudança de cor. Não respondes, nem reages... Terá sido do frio a que eu mesmo te sujeitei? Então acrescento, como que para quebrar o gelo: "Lembras-te de te ter pedido para abandonares um sopro na concha que fiz com as minhas mãos? Libertei-o no bolso das minhas calças e cosi-o para te poder ter perto de mim... Este é o teu último fôlego, desde a última vez que te vi. E tive tanto medo de perdê-lo..."

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Momento #7

Irrita-me o romantismo hiperbolizado, o amor de geração espontânea, o uso ilimitado de expressões que outrora nos arrepiavam, a confusão de sentimentos, a constante explosão de acontecimentos, os passos apressados da baixa lisboeta, os metros cheios à hora de ponta, os jornais do dia, com letras gordas sobre futebol, os telejornais, o sofrimento exagerado, as declarações lamechas. Irritam-me aqueles que se fazem de vítimas, os fracos, os fracassados, os que nunca lutaram, os que nunca sequer se ergueram, os que julgam os outros sem motivos, os falsos moralistas, os namoros repentinos, o amor à primeira vista, os sorrisos cínicos, a hipocrisia social, as modas, as músicas que todos ouvem, os que tentam ser mais e melhor, não por si, mas para não fazerem má figura ao pé do amigo X ou Y.
A mim, irrita-me o quotidiano.

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Welcome back home


O calor que a chama da lareira exala aquece-me. Um vento intenso lá fora, enrola o fumo no escape da chaminé e faz com que volte ao meu encontro. Cheira-me a madeira queimada e rapidamente associo esse cheiro ao chocolate quente e às saudades que dele já tenho; às minhas saudades tuas.
Recosto-me na cadeira, com um dedo a marcar o meio de livro que lia anteriormente, e fixo um ponto aleatório na imagem de um qualquer programa que está a dar na televisão. O lume morre e apresso-me a ateá-lo novamente, sem sequer ter tempo de me enterrar em pensamentos passados, e ainda bem. Olho agora fixamente para o fogo que consome a lenha, como um mendigo faminto e reconheço-me. Fogo, eu; lenha, tu. Podia consumir-te, calorosamente, enquanto te me desses, mas já não o fazes. Duvido até que alguma vez o tenhas feito.
O fumo que se foi acumulando na sala tornou o ar irrespirável, o que me leva a abrir a janela. Bonito paradoxo: acender a lareira com uma janela aberta, como que a criar um fluxo entre altas e baixas temperaturas, propícias a que contraia uma constipação ou qualquer outra maleita do género.
Paro e olho, reparo no choque entre o fluxo quente e frio e quase que os oiço a desferirem golpes violentos um sobre o outro. Arrepio-me de repente e fecho a janela. O frio venceu, tal como sempre. Na maioria das ocasiões é o pólo negativo que leva a melhor. Tu, levaste como certo o meu lado negativo.
Apetece-me uma caneca de chocolate quente. É bom ter-te de volta, como no primeiro dia, como se não te conhecesse.

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Momento #6



A extinção do homem vai-se dever à banalidade da sua existência e ao facto de tentar desmitificar tudo. Quando não houver mais nada a fazer, rende-se à sua conduta animal e não sobrevive sem os seus engenhos mecânicos. O orgânico é passado desde que o homem é presente.